Há ideais que
são difíceis de cumprir. Para muitos, o poder incluído, o ideal seria existirem
Forças Armadas sem o custo de serem Forças Armadas. Existirem na forma, mas não
no conteúdo, ou melhor ainda, que o conteúdo não tivesse custos. Foi então que
começou a desenhar-se a intenção de “funcionalizar” os militares. Sendo os
militares apenas uma outra versão de funcionários públicos, poupar-se-iam os
meios que geralmente lhes são postos à disposição e as condições especiais que
hes são inerentes. É evidente que, mantendo-se o princípio da “condição
militar”, apenas no essencial, para lhes poder restringir algumas liberdades
individuais e mantê-los em permanente disponibilidade, era uma solução
inteligente, na arrevezada concepção de inteligência que os nossos governantes
cultivam. Sobrava um problema, que era a questão dos meios materiais para que
as Forças Armadas continuassem armadas. É uma chatice, mas os militares não
conseguem cumprir as suas missões sem armamento e equipamento especializado.
Portanto, não se pondo a hipótese de, pura e simplesmente, extinguir as Forças
Armadas, havia que menorizá-las, dominá-las e reduzir-lhes os “excessos” de
regalias que, na óptica do poder, eram uma afronta aos restantes cidadãos.
Durante anos e
anos de democracia, embora esta lhes tenha sido oferecida de mão beijada pelos
militares, os vários poderes vigentes foram tratando de denegrir, numa campanha
surda, mas meticulosa, a identidade dos militares aos olhos da população em
geral, e a técnica tem surtido efeito. Hoje em dia os militares são
considerados por muitos como um peso inexplicável na sociedade. É certo que
perderam efectivos, o que é compreensível, desde que fruto de uma redimensão
ajuizadamente estruturada, mas perderam essencialmente a aceitação, factor importante
do sentido de nação, por parte da generalidade do país e têm sofrido uma
consequente e visível degradação da sua dignidade, consubstanciada na profunda
descaracterização que sofreram na Condição Militar que, por assim dizer, lhes
traçava uma identidade bem definida, de acordo com aquilo que se lhes exige
como garante da soberania nacional.
Os militares
sofrem de muitos e complexos problemas, aliás comuns à grande maioria dos
outros cidadãos, mas todos eles radicam, numa primeira abordagem, deste postulado
da sua real necessidade de existência, permitindo-nos assim avançar com a
seguinte dúvida: quer ou não o país a manutenção de umas Forças Armadas capazes
e inseridas no actual quadro político e económico, que é europeu, mas também
irrevogavelmente nacional e tem a ver com um verdadeiro sentido de
nacionalidade?
Há coisas que
são indissociáveis e uma delas é que as Forças Armadas não se podem discutir
sem tomar em linha de conta as pessoas que nelas servem. Os militares são
cidadãos como quaisquer outros, mas também é verdade que são cidadãos que se
expõem a condições que não se exigem a mais ninguém. Os militares, goste-se ou
não, concorde-se ou não, estão sujeitos a um compromisso de honra único e para
isso têm uma formação única para cumprimento duma missão única que
inevitavelmente os distingue do resto da população. Têm restrições e obrigações
únicas e é isso que os distingue dentro da igualdade. Essa distinção não lhes é
atribuída por capricho ou conluio com quaisquer falsos predicados, é-lhes exigida
pela força de razão das suas naturais atribuições de defesa e salvaguarda da
Pátria.
Pretender que
eles honrem os seus compromissos, assumidos em juramento perante a Bandeira
Nacional e ao mesmo tempo forçá-los a equipararem-se a todos os outros servidores
do Estado, é não só irracional como atentatório do verdadeiro cumprimento da
sua missão profissional.
É portanto
pertinente saber-se, não se excluindo mesmo um referendo nacional, se o País
quer ou não Forças Armadas. Se está disposto a suportá-las, como uma garantia
da existência de um corpo especial inegavelmente ligado à concepção da
manutenção de um estado independente ou se se considera tal instituição um peso
de custo elevado e dispensável no actual panorama geopolítico. Os militares não
podem apenas ser tolerados! Ou são inequivocamente aceites e mesmo
indispensáveis ao País, ou então a sua existência diminuída, tolerada e
constantemente denegrida, não faz sentido. Nenhum cidadão pode viver com este
estigma de ser apenas tolerado e repetidamente acusado de estar a mais na
sociedade a que pertence.
Hoje mesmo, 15
de Março, os militares, enquadrados pelas suas associações profissionais, ANS –
Associação Nacional de Sargentos, AOFA – Associação de Oficias das Forças
Armadas e AP – Associação de Praças, e assumindo-se na sua condição mais
abrangente de Família Militar, onde se vão igualmente inserir ex-alunos dos
Estabelecimentos Militares de Ensino (CM – Colégio Militar, IO – Instituto de
Odivelas e IPE – Instituto dos Pupilos do Exército), que se confrontam também
com a injustificada extinção do Instituto de Odivelas e sua integração no
Colégio Militar, num total desrespeito por instituições centenárias que muito
têm contribuído com a formação de “Cidadãos úteis à Pátria”, vêm para a rua
mostrar o seu desagrado com a situação que vivem e denunciar as cada vez mais
difíceis condições em que são obrigados a desempenhar as suas missões. E vêm
para a rua, não porque gostem ou isso faça parte de qualquer estratégia de
desestabilização política. As Associações Profissionais tudo têm feito para
dialogar com a tutela, mas esse diálogo é quase nulo ou inconsequente. O
Ministro da Defesa, que apenas desempenha um cargo para o qual não tem qualquer
competência, é apenas o gestor de crise. A política de autismo é emanada pelo
próprio Primeiro Ministro. As Associações, que deveriam ser ouvidas em muitos
dos temas em discussão, são ignoradas e isso, como é evidente, retira-lhes
margem de manobra para poderem contribuir com bom senso e conhecimento de
causa, deixando-as sem alternativa, que não seja mostrar em público a sua
profunda preocupação com o estado de degradação que a Instituição Militar vem
atingindo.
Os militares
não devem ser, nem ignorados nem tolerados. Não são descartáveis e não podem
ser transformados em funcionários públicos que usam farda. São “Cidadãos em
Uniforme”. Uma símbolo cívico da Nação em armas, que é um conceito
completamente diferente, só não entendido por quem não respeita os valores mais
profundos de uma Nação. E as Forças Armadas não podem ser arrumadas debaixo do
tapete da incompetência que reina… Ou então, assumam inequivocamente a sua
superfluidade!…
Ernâni Balsa
2 comentários:
Naturalmente, os militares da ativa e os reformados e a grande maioria da população se sintam oprimidos, frustados e decepcionados com esta triste realidade!
Boa Amiga Celle,
É uma vergonha o que está acontecendo...
Beijinhos amigos e solidários.
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