27/02/2010
O POLVO...
Algumas pessoas acharam exagerado, se não mesmo injustificado, o título de primeira página da última edição do SOL: O Polvo.
É natural: há quem tenha falta de memória e quem não conheça suficientemente o mundo dos media para avaliar o que se tem passado.
Como principal responsável por esse título, tenho todo o gosto em justificá-lo.
O caso já vem de longe.
Há perto de dois anos, a Ongoing comprou o grupo Económica (proprietário do Diário Económico) por uma quantia exorbitante, substituiu o director do jornal e pensou em transformá-lo num ‘órgão oficioso’, através do qual o Governo faria passar algumas mensagens.
O caso da TVI é conhecido e não vale a pena insistir nele: a Ongoing (sempre ela) ‘retirou’ Moniz da direcção-geral da estação e a Prisa (grupo espanhol ligado ao PSOE) fez o resto, removendo Moura Guedes da antena.
O director do Público, outro dos inimigos apontados por Sócrates, foi substituído na direcção do jornal.
O SOL, também tido por persona non grata, foi alvo de uma tentativa de estrangulamento (capitaneada por Armando Vara) por parte do BCP – banco que era nosso accionista mas aceitou transformar-se num Cavalo de Tróia.
O DN foi o pivô da duvidosa campanha que envolveu o assessor de imprensa do Presidente da República, Fernando Lima.
O JN recusou publicar um artigo de Mário Crespo incómodo para Sócrates.
Além disso, ficou claro que a PT tentou montar um grupo de media afecto ao Governo – facto que Henrique Granadeiro começou por negar mas acabou por reconhecer, dizendo-se enganado por dois dos seus administradores (o termo foi mais explícito).
Um desses administradores é um jovem do PS que organizou o site da recandidatura de Sócrates à chefia do Governo e foi posto na cúpula da PT com um ordenado faraónico.
Para organizar esse grupo de media, a PT fez diligências junto da Prisa e da Ongoing com vista à aquisição da TVI, e manteve contactos com o grupo Cofina, de Paulo Fernandes, e com o grupo Controlinveste, de Joaquim Oliveira.
A agência Lusa, de que o Estado é accionista, foi alvo de diversas mudanças de direcção – e em certas matérias (como o processo ‘Face Oculta’) houve orientações no sentido de proteger o Governo.
A RTP só se referiu às escutas divulgadas pelo SOL mais de 12 horas depois de a notícia ser pública, facto que causou mal-estar e atritos na redacção.
Para lá disto, a RTP ‘dispensou’ Marcelo Rebelo de Sousa, com a justificação de que deixava de ter o ‘contrapeso’ de António Vitorino – o que é um argumento discutível, visto que o programa de Marcelo era anterior ao de Vitorino e sempre teve existência autónoma.
Paralelamente, foram aliciados antigos jornalistas ou pessoas com ligações aos media, como o bastonário dos advogados, Marinho Pinto, o ex-director da SIC Emídio Rangel ou o ex-presidente da RTP João Carlos Silva.
Neste aspecto, o caso de Marinho Pinto é o mais chocante, pois passou de acérrimo defensor do 4.º poder, quando era jornalista, a cão de fila do poder político.
Para se proteger, o Governo contratou ainda prestigiados advogados, como Proença de Carvalho e José Miguel Júdice, que em diferentes ocasiões têm saído em defesa do primeiro-ministro.
A juntar a isto, criou-se na comunicação social um ambiente de medo, decorrente de três factores: ameaças às empresas de media de cortes no financiamento bancário, distribuição desigual de publicidade por parte do Estado e pressão política sobre os accionistas.
Em ambiente de crise económica e financeira, estes três factores fabricaram um cocktail explosivo.
1. Bancos próximos do Governo ameaçaram dificultar o acesso ao crédito a empresas proprietárias de órgãos de comunicação que se mostrassem rebeldes em relação ao poder;
2. Divulgou-se a ideia de que o Governo (e empresas públicas dele dependentes) discriminaria negativamente, em termos de publicidade, os órgãos de comunicação que o criticassem;
3. Houve chantagens sobre accionistas de meios de comunicação social, ameaçando-os com dificuldades na sua vida empresarial (mesmo fora da área dos media) caso os meios dos quais eram sócios se ‘portassem mal’.
Em muitos casos, poderia tratar-se de ameaças vãs.
Mas as pessoas nunca sabem – e em época de crise é preferível jogar pelo seguro…
O simples medo da existência de problemas funcionou como forma de coacção, levando a cautelas editoriais.
Depois disto ainda haverá dúvidas sobre a existência de um polvo?
O que espanta, aqui, é a enorme quantidade de casos que têm vindo a verificar-se sem que nada aconteça.
Dir-se-ia que o país está anestesiado, já não reage, de tal forma graves são os indícios.
E alguns militantes do PS, que se bateram no passado pela liberdade de imprensa, fingem que não vêem, para não serem obrigados a tomar posição.
Claro que os defensores de Sócrates continuarão a dizer que não há nenhuns sinais de interferência nos órgãos de informação.
Mas isso é normal: os adeptos do Benfica ou do FC Porto nunca acham justo um penálti a favor do adversário, por mais evidente que seja.
Por isso mesmo é que existe o ditado: «O pior cego é o que não quer ver».
Mas as mensagens de apoio e incentivo que tenho recebido no e-mail, no telemóvel e espontaneamente na rua mostram que muitos portugueses já perceberam o que se passa. Talvez a maioria.
P.S. – Nunca defendi a demissão de Sócrates. Nem hoje o faço. Mas o estado de apodrecimento a que chegou a sua entourage (uns são arguidos, outros são suspeitos, outros estão desacreditados), a sua própria falta de honorabilidade (que permite, por exemplo, que um jornal de referência escreva em título de primeira página As mentiras de Sócrates…), levam a que, a partir de agora, o PS e o Governo tenham entrado num plano inclinado onde irão perdendo continuamente força. Se Sócrates durar até às presidenciais (o que é muitíssimo difícil), o PS chegará lá esfrangalhado e sem energia para apoiar consistentemente um candidato alternativo, proporcionando a Cavaco um passeio tranquilo. E então, depois dessas eleições, a saída do PS do poder será inexorável.
Artigo de opinião no Jornal "SOL" , por JAS
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
1 comentário:
Foi boa ideia colocar aqui as fotos, para as pessoas as olharem com atenção, para que, no momento da caça aos ratos, não os deixar escapar. A desratização tem que ser completa, para não correr o risco de ser ineficaz. Não pode ficar semente do mal.
Um abraço
João
Sempre Jovens
Enviar um comentário