"Vós que lá do vosso império, prometeis um mundo novo...CUIDADO, que pode o povo, querer um mundo novo a SÉRIO!" In: António Aleixo

19/05/2013

ANÁLISE PERFEITA...




Existe o “Yes man”. Todos sabem quem é e o mal que causa. Mas existe o “May-be-man”. E poucos sabem quem é. Menos ainda sabem o impacto desta espécie na vida nacional. Apresento aqui essa criatura que todos, no final, reconhecerão como familiar.
O “May-be-man” vive do “talvez”. Em português, dever-se-ia chamar de “talvezeiro”. Devia tomar decisões. Não toma. Simplesmente, toma indecisões. A decisão é um risco. E obriga a agir. Um “talvez” não tem implicação nenhuma, é um híbrido entre o nada e o vazio.
A diferença entre o Yes man e o “May-be-man” não está apenas no “yes”. É que o “may be” é, ao mesmo tempo, um “may be not”. Enquanto o Yes man aposta na bajulação de um chefe, o “May-be-man” não aposta em nada nem em ninguém. Enquanto o primeiro suja a língua numa bota, o outro engraxa tudo que seja bota superior.
Sem chegar a ser chave para nada, o “May-be-man” ocupa lugares chave no Estado. Foi-lhe dito para ser do partido. Ele aceitou por conveniência. Mas o “May-be-man” não é exatamente do partido no Poder. O seu partido é o Poder. Assim, ele veste e despe cores políticas conforme as marés. Porque o que ele é não vem da alma. Vem da aparência. A mesma mão que hoje levanta uma bandeira, levantará outra amanhã. E venderá as duas bandeiras, depois de amanhã. Afinal, a sua ideologia tem um só nome: o negócio. Como não tem muito para negociar, como já se vendeu terra e ar, ele vende-se a si mesmo. E vende-se em parcelas. Cada parcela chama-se “comissão”. Há quem lhe chame de “luvas”. Os mais pequenos chamam-lhe de “gasosa”. Vivemos uma nação muito gaseificada.
Governar não é, como muitos pensam, tomar conta dos interesses de uma nação. Governar é, para o “May-be-man”, uma oportunidade de negócios. De “business”, como convém hoje, dizer. Curiosamente, o “talvezeiro” é um veemente crítico da corrupção. Mas apenas, quando beneficia outros. A que lhe cai no colo é legítima, patriótica e enquadra-se no combate contra a pobreza.(…)
(…) O “May-be-man” entendeu mal a máxima cristã de “amar o próximo”. Porque ele ama o seguinte. Isto é, ama o governo e o governante que vêm a seguir. (…).
(…) O “May-be-man” descobriu uma área mais rentável que a especulação financeira: a área do não deixar fazer. Ou numa parábola mais recente: o não deixar. Há investimento à vista? Ele complica até deixar de haver. Há projeto no fundo do túnel? Ele escurece o final do túnel. Um pedido de uso de terra, ele argumenta que se perdeu a papelada. Numa palavra, o “May-be-man” actua como polícia de trânsito corrupto: em nome da lei, assalta o cidadão.
Eis a sua filosofia: a melhor maneira de fazer política é estar fora da política. Melhor ainda: é ser político sem política nenhuma. Nessa fluidez se afirma a sua competência: ele sai dos princípios, esquece o que disse ontem, rasga o juramento do passado. E a lei e o plano servem, quando confirmam os seus interesses. E os do chefe. E, à cautela, os do chefe do chefe.
O “May-be-man” aprendeu a prudência de não dizer nada, não pensar nada e, sobretudo, não contrariar os poderosos. Agradar ao dirigente: esse é o principal currículo. Afinal, o “May-be-man” não tem ideia sobre nada: ele pensa com a cabeça do chefe, fala por via do discurso do chefe. E assim o nosso amigo se acha apto para tudo. Podem nomeá-lo para qualquer área: agricultura, pescas, exército, saúde. Ele está à vontade em tudo, com esse conforto que apenas a ignorância absoluta pode conferir.
Apresentei, sem necessidade o “May-be-man”. Porque todos já sabíamos quem era. O nosso Estado está cheio deles, do topo à base. Podíamos falar de uma elevada densidade humana. Na realidade, porém, essa densidade não existe. Porque dentro do “May-be-man” não há ninguém. O que significa que estamos pagando salários a fantasmas. Uma fortuna bem real paga mensalmente a fantasmas. Nenhum país, mesmo rico, deitaria assim tanto dinheiro para o vazio.
O “May-be-man” é utilíssimo no país do talvez e na economia do faz-de-conta. Para um país a sério não serve.
Mia Couto
NOTA:
Embora o Mia Couto tenha escrito isto reportando-se ao que se passa em Moçambique, é indiscutível que se aplica direitinho a muitos outros países. Na minha opinião, acho que, além dos “yesmen” e dos “maybemen”, o que há mais por aí são os “soldmen” (os “vendidos”!).
João Brito

1 comentário:

São disse...

Infelizmente, o que Mia Couto diz do seu país aplica-se totalmente a Portugal.

O caso do Banif é uma das maiores patufarias deste Governo de crápulas!

Boa semana, caro amigo.