"Vós que lá do vosso império, prometeis um mundo novo...CUIDADO, que pode o povo, querer um mundo novo a SÉRIO!" In: António Aleixo

15/06/2009

O SILÊNCIO DOS CULPADOS



Verdade e transparência é imprescindível
O silêncio dos culpados
JN. 090615. 00h30m, Por Mário Crespo

O estridente protesto de Paulo Rangel por causa da roubalheira no BPN foi idêntico aos sonoros ultrajes de Sócrates por causa do Freeport.

Além de serem questões criminais, o Freeport e o BPN são temas políticos. Exigem dos políticos participação na denúncia e na condenação. Porque foram abusos de valores públicos. Porque interpelam violações da ética republicana. Por isso não toleram os pactos de silêncio. A abordagem pública descomplexada e livre tem que ser feita em debate político nos locais onde a política se debate.

No Freeport e no BPN há áreas que nada têm a ver com segredos de justiça e onde a Presunção de Inocência não pode ser usada como uma espécie de asilo onde os poderosos se resguardam do escrutínio público. É impossível aceitar a relutância que todos os partidos têm manifestado em abordar os dois grandes casos de corrupção que envolvem as que (ainda) são as maiores forças políticas do País. Das vezes que o caso Freeport surgiu no Parlamento, logo Sócrates vociferou ultrajado que era insultuoso abordar a questão e, um a um, os partidos da oposição recolheram-se em embaraçados silêncios pelo atrevimento de terem abordado tão incómodo tema para o Primeiro Ministro. Na campanha das Europeias o estridente protesto de Paulo Rangel por causa da "roubalheira" no BPN foi idêntico aos sonoros ultrajes de Sócrates no Freeport, denotando que o bloco central continua a viver de pactos informais onde, por ética perversa, a regra é não falar dos crimes uns dos outros.

Por força da maioria socialista, o Freeport não vai ter, nesta legislatura, direito sequer a uma comissão de inquérito sobre, por exemplo, boas práticas dos governos de gestão em despachos de última hora. Não que uma comissão de inquérito seja substituto adequado ao contraditório vigoroso e plural que só o Plenário permite. É uma espécie de do-mal-o-menos. Quando muito, poderá ter uma função complementar no apuramento de factos se o problema já estiver suficientemente denunciado em termos políticos, o que não é o caso nem do Freeport nem do BPN.

Aqui a Presunção de Inocência que os prevaricadores reclamam tem funcionado não como garantia de direitos, mas como abuso de privilégios, resguardando transgressores e dando-lhes tempo para continuar em actividade enquanto prejudicam o apuramento de verdades frequentemente indemonstráveis, como o atestam os inúmeros arquivamentos insólitos e os prazos convenientemente prescritos. É devido à ausência de debate franco, duro e leal sobre estes casos políticos que aos media foi deixado o trabalho "sujo" de esgravatar pormenores, tentando compor uma imagem do que se passa, milhão a milhão, num mundo de falsidades e aparências onde é normal comprar casas a offshores e ter rendimentos com juros nas centenas que nem a Dona Branca prometia. Nesta busca, os media têm operado num ambiente tóxico de ameaças de processos e condenações da Entidade Reguladora da Comunicação Social e do Sindicato dos Jornalistas, que já chegaram ao pormenor sinistro de produzir análise crítica da semiótica da gestualidade dos jornalistas que dão as notícias mais incómodas. Enquanto isto, o mundo da política obscura sobrevive em convenientes silêncios criando inocências a prazo em que se perpetuam práticas de ilicitude. Ficam intactas as "roubalheiras" que, eu confio, sejam bem debatidas, sem medos, nas próximas eleições e em próximos parlamentos.

NOTA: E assim se compreende que o combate à corrupção e ao enriquecimento ilícito, há anos proposto por João Cravinho, tenha ficado em banho-maria, porque como diz o Mário Crespo «o mundo da política obscura sobrevive em convenientes silêncios», «o bloco central continua a viver de pactos informais», «a Presunção de Inocência» significa «abuso de privilégios» e é «uma espécie de asilo onde os poderosos se resguardam do escrutínio público». Estas palavras de síntese são demasiado intoxicantes para poderem manter-se verdadeiras, devendo as suas causas ser atacadas pela raiz com séria «denúncia e condenação».

Publicado Do Miradouro
http://www.domirante.blogspot.com/

1 comentário:

A. João Soares disse...

Caríssimo Luís,
Agradeço a tua correcção e lealdade para com os visitantes em indicares a origem dos textos que transcreves.
Agradeço pessoalmente a referência ao meu blog que julgo ser merecedor de ser visitado e comentado. Pelo menos faço quanto posso para lhe dar qualidade.

Um abraço
João