"Vós que lá do vosso império, prometeis um mundo novo...CUIDADO, que pode o povo, querer um mundo novo a SÉRIO!" In: António Aleixo

10/03/2010

ANTIPOLÍTICA E ESTADO EXÍGUO

Nas transformações que se deram em Portugal, desde 1974, e no Mundo desde 1989. A UE tem levado a Europa no caminho desejado pelas suas elites políticas, económicas e pelos seus burocratas, que não pelos cidadãos europeus, que nunca foram ouvidos sobre o que desejavam para o seu futuro.
Mas nas minhas leituras deparei com o conceito de “antipolítica”! É uma posição ética, política e cultural da sociedade civil, que contesta que os interesses da classe política sejam idênticos aos da comunidade. A “antipolítica” representa uma afirmação de permanente independência do poder, seja quem for que o exerça, e desafia as representações impostas pelas elites políticas para servir os seus interesses. A “antipolítica” é uma força moral dentro da sociedade civil que desconfia e rejeita o monopólio do poder pela classe política dentro de um Estado. Não anseia derrubar o Estado, mas opõe-se ao poder político que é exercido. Martin Luther King, Václav Havel e George Konrad podem ser considerados como expoentes deste movimento.
Konrad afirma que qualquer que seja a ideologia que um político defenda, o que ele disser é apenas um meio para ganhar e manter o poder, um fim em si mesmo. E adianta que a "antipolítica” é a actividade dos que não querem ser políticos, é um contra-poder que não pode nem deseja assumir o poder. A “antipolítica” não apoia nem se opõe aos governos. Os seus adeptos mantêm o poder político sob observação e pressão, apenas com base na sua estatura cultural e moral, não através de uma legitimidade eleitoral. É, acima de tudo, a rejeição do monopólio do poder da classe política. Se a oposição política chegar ao poder, os antipolíticos manterão a mesma distância e a mesma independência do novo governo.1
Ora, esta divagação teórica aplica-se integralmente ao nosso País, face à incapacidade, incompetência e falta de vontade dos partidos políticos em resolver os problemas estruturais de Portugal. Aproximamo-nos perigosamente da condição de “Estado exíguo”! As capacidades institucionais de formular e executar políticas, administrar com eficiência, controlar os abusos de poder, a corrupção e o suborno, manter a transparência e a responsabilidade nas instituições públicas, e (mais importante de tudo) fazer cumprir as leis, estão notoriamente diminuídas.2
Os resultados das últimas eleições legislativas indicam claramente uma menor capacidade de se manter um governo estável, uma oposição que não se configura como alternativa credível, e também a perda de credibilidade do Presidente da República para arbitrar eventuais conflitos políticos, conforme se pode comprovar pelas críticas às suas declarações, a partir do Verão de 2009. No plano internacional, a nossa credibilidade económica e financeira decresce perigosamente e já surgem opiniões que prevêem a nossa iminente exclusão da “zona Euro”. Em resumo, a nossa classe política é manifestamente incapaz de liderar e de inspirar confiança ao País. Estamos pois bastante longe de poder excluir um cenário em que a agitação e os conflitos sociais se agudizem e o poder esteja em risco de cair na rua.
Nos momentos de crise e convulsão profundas, deveriam ser as Forças Armadas a tomar nas suas mãos o destino da Nação. Os tempos assemelham-se perigosamente aos do final da 1.ª República, e nunca se sabe quanta mais incompetência e falta de sentido de estado poderá este destroçado País suportar. A minha grande dúvida é se as Forças Armadas, despojadas durante anos da sua dignificação e castradas dos seus princípios éticos fundamentais por uma classe política cujo objectivo principal foi sempre tê-las “baratas e mansas” (enquanto os Chefes militares fingem que não percebem), estarão à altura de desempenhar de novo essa tarefa patriótica, se a isso forem chamadas.

EDUARDO SILVESTRE DOS SANTOS
TGEN/PILAV (Reforma)

1 KONRAD, George –"antipolitics:", Routledge, London & New York, 1998, pp. 283-285.
2 FUKUYAMA, Francis –, Gradiva, 2004, p. 22.

Publicado no DN. De 24/02/2010

1 comentário:

Anónimo disse...

COMENTÁRIO À “ANTI POLÍTICA E ESTADO EXÍGUO”
Com o título em epígrafe escreveu o general Eduardo Silvestre – meu camarada de armas que muito prezo por o considerar um bom profissional e pessoa de bem – um artigo num Diário de Notícias de há poucas semanas.
O escrito é curioso, levanta questões pertinentes e por isso – com a devida vénia – me proponho glosá-lo.(...)
(...)Sendo contra poder, não deseja, todavia assumir esse poder. Elabora, de seguida, sobre a perda de capacidades do nosso país, a caminhar para a situação que classifica de estado “exíguo”; para terminar dizendo que perante este plano inclinado a que se junta a inoperância e descrédito dos órgãos de soberania e da classe política em geral que considera “manifestamente incapaz de liderar e de inspirar confiança ao País”, restará às Forças Armadas (FAs) tomar novamente o poder, já que “os tempos se assemelham aos do final da I República”. Tem, contudo, claras dúvidas se as FAs “estão à altura de desempenharem de novo essa tarefa patriótica”.(...)(...)Mas as questões verdadeiramente primaciais que o artigo levanta são as da legitimidade do Poder, e o que fazer quando a degradação do seu exercício vai subverter o que é suposto defender e garantir: a Segurança, a Justiça e o Bem-estar, da Nação organizada politicamente em Estado. Ou seja duas questões clássicas que não estão até hoje resolvidas!
Sem embargo, da leitura do artigo, pode-se facilmente concluir, estarmos em face do desaparecimento de Portugal (estado exíguo), e de uma extensa degradação da situação política, económica, financeira e social – o que justificará uma eventual intervenção política das FAs – o que, como se sabe, lhes está constitucionalmente vedado(...) (...)Ou seja, é o próprio sistema, “soit dizant”, democrático que está em causa, através da sua falência prática!
Não deixa de ser curioso isto, quando se está comemorando os 100 anos da República!(...) Ora como pelos vistos se passou a discutir, publicamente, as hipóteses de golpe de estado (a TVI 24H também abordou o assunto), vamos lá analisar a capacidade das FAs para pararem a queda do país no precipício (trata-se apenas de um estudo académico (…).
(...) Agora, que existe uma tendência para regredirmos a 1926, isso existe. A responsabilidade para resolver as crises existentes é do Poder Político. As FAs só devem intervir à beira do abismo (embora seja difícil determinar onde ele começa e se é desejável beber o “cálice” até ao fim). Fazê-lo antes é assumir uma responsabilidade que não lhes cabe e arranjar uma desculpa para os políticos. Além disto será necessário encontrar alguma forma de entendimento/neutralização das três únicas instituições com poder em Portugal, a saber: a Igreja, a Maçonaria e o Partido Comunista.
Finalmente, mas não menos importante, como se vai alimentar a população, já que o nosso tecido produtivo está nas ruas da amargura? a população perdeu hábitos de trabalho e sacrifício e não existem reservas alimentares que cheguem para uma semana!
Espero pois que numa próxima hipotética vez, se façam as coisas com alguma cabeça e profissionalismo e sem ingenuidades.
Estou em crer que seria desejável não termos que passar por mais nenhuma destas experiências, que se sucedem desde 1817.
Mas não estou optimista.
João José Brandão Ferreira
TCor Pilav (Ref)